sexta-feira, 30 de maio de 2008

Envolverde - Bolsa Floresta vai ser estendido para mais seis unidades de conservação


O Programa Bolsa Floresta, desenvolvido pela Fundação Amazonas Sustentável, vai ser estendido para mais seis unidades de conservação estaduais a partir da segunda quinzena de junho. A ampliação das ações motivou a assinatura do primeiro convênio entre a FAS e a Universidade Federal do Amazonas e a abertura de novas vagas de trabalho. As estratégias para ampliação do Bolsa Floresta foram divulgadas na tarde da quinta feira (29), pelo diretor geral da instituição, Virgilio Viana.

As Unidades de Conservação Estaduais agora incluídas no BF são as Reservas de Desenvolvimento Sustentável de Anamã , Canumã, Juma, Rio Madeira, Reserva Extrativista Rio Gregório e Florest de Maués.

Com as novas inclusões , o BF atenderá mais duas mil famílias, além das 2.102 cadastradas e residentes nas áreas protegidas atendidas na primeira fase do Programa. O Bolsa Floresta já está implantado nas RDS Uatumã, Mamirauá, Piagaçu-Purus,Uacari, Cujubim e na Reserva Extrativista de Catuá-Ipixuna. Com um total de doze UCs, o BF alcançará mais de quatro mil famílias até o fim deste ano.

Para atender às necessidades de pesquisa nas áreas atendidas pelo Bolsa Floresta, a FAS assinou o convênio com a UFAM que estabelece o Programa de Gestão Florestal e Serviços Florestais em Unidades de Conservação.

O acordo oferece 20 vagas de estágio para estudantes das áreas de engenharia Florestal e engenharia de Pesca. A seleção dos estudantes será feita pela Coordenação de Estágio Supervisionado de Engenharia Florestal da UFAM. Os estagiários vão atuar sob a orientação dos professores e técnicos da FAS dentro das áreas atendidas pelo BF.

O trabalho de campo será realizado do dia 18 de julho a 18 de agosto. "Os alunos analisam as roças, formas de produção florestal e pesqueira, apontando alternativas para melhoria de geração de renda ", explicou Virgilio Viana. A assinatura do convênio foi acompanhada pelo pró-reitor de graduação da UFAM, Bruce Osborne, e pelos professores do departamento de Ciências Florestais, Manoel de Jesus, Narrubia Martins e Sérgio Gonçalves.

Novas vagas

O trabalho de planejamento das ações do Programa também exige a contratação de profissionais especializados. A Fundação Amazonas Sustentável está recebendo curriculos para tres vagas, cada uma nas seguintes especialidades: coordenador do Programa Bolsa Floresta; Coordenador de Projetos Especiais e Coordenador Científico.

Para essas vagas é exigida formação superior com conhecimento em elaboração de projetos, ações de desenvolvimento sustentável, manejo de recursos florestais e /ou pesqueiros, conhecimento sobre Unidades de Conservação e mobilização comunitária.

O candidato deve apresentar capacidade para liderar equipe, identificar oportunidades de parcerias institucionais com captação de recursos e contar com experiência em elaboração e avaliação de projetos em desenvolvimento sustentável. Exige-se que o selecionado tenha disponibilidade para viagens.

Compromissos

A Fundação Amazonas Sustentável é uma instituição privada, sem fins lucrativos, de interesse público, não governamental, instituída em dezembro de 2007. A FAS tem como compromisso a conservação das florestas e a melhoria da qualidade de vida das populações que vivem nessas áreas. De caráter independente, a Fundação Amazonas Sustentável não é vinculada a governos e partidos políticos.

O Bolsa Floresta é um dos programas desenvolvidos pela Fundação Amazonas Sustentável. O BF é uma recompensa financeira para aqueles que assumem o compromisso de conservar suas florestas.

O Programa tem quatro componentes: BF Familiar inclui o pagamento mensal de R$ 50 por mês a representantes de famílias residentes dentro de Unidades de Conservação estaduais; o BF Associação destinado às associações dos moradores das unidades de conservação do estado. Equivale a 10% da soma de todas as Bolsas Floresta Familiar. Sua função é fortalecer a organização e o controle social do Programa.

O terceiro é o BF Renda, no valor médio de R$ 4 mil por comunidade por ano. Este componente é destinado ao apoio à produção sustentável: peixe, oleos vegetais, frutas, mel etc.

O quarto componente é o BF Social, no valor médio de R$ 4 mil por comunidade, por ano. Este recurso é destinado à melhoria da educação, saúde, comunicação, transporte e outros elementos básicos para a construção da cidadania dos guardiões da floresta.


(Envolverde/Governo do Estado do Amazonas)

Valor - Mangabeira volta a negar polêmica entre desenvolvimento e preservação da Amazônia

Por Agência Brasil

BELÉM (PA) - O ministro extraordinário de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, voltou a negar que haja polêmica entre desenvolvimento e preservação ambiental na Amazônia.

"O maior problema é que estamos aquém tanto em medidas de preservação quanto em medidas de desenvolvimento", disse o ministro, ao chegar ao 1º Fórum de Governadores da Amazônia Legal. O objetivo do encontro é discutir propostas comuns de desenvolvimento sustentável a serem implementadas pelos nove estados que compõem a região (Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins).

Segundo Mangabeira, a população "anseia a reconciliação" entre o crescimento econômico e a proteção da floresta. "Palavras não bastam. Agora precisamos de atos". Questionado sobre as ações a serem adotadas para viabilizar essa "reconciliação", o ministro respondeu que, como coordenador do Plano Amazônia Sustentável (PAS), não pode antecipar medidas.

"A decisão é coletiva e depende, em última instância, do presidente da República e dos governadores da região". O ministro listou as prioridades do PAS que serão debatidas hoje com os governadores da Amazônia Legal, entre elas a regularização fundiária, a elaboração do zoneamento econômico-ecológico e a construção de vínculos entre a floresta e as indústrias.

(Agência Brasil)

Valor - Um plano B para a Amazônia

Por Daniela Chiaretti

Foi respondendo aos editoriais da imprensa internacional que o presidente Lula começou a semana, em evento na sede do BNDES: "O mundo precisa entender que a Amazônia brasileira tem dono e que o dono é o povo brasileiro". E seguiu fazendo a defesa dos "quase 25 milhões de habitantes" que moram lá e "querem ter acesso aos bens que nós temos aqui no Rio e em São Paulo". Tudo ótimo e muito legítimo, não fosse por dois pontos fundamentais: precisa definir quem, dentro do governo, lidera a turma quando o assunto é Amazônia e, ainda mais importante, precisa ter um plano.

O PAS não vale. Nem quando foi desenhado, em 2003, o Plano Amazônia Sustentável tinha esta ambição. À época, é verdade, ele embutia sugestões originais, como um comando único sobre todas as fontes de financiamento existentes - do BNDES ao Pronaf, passando pelos fundos setoriais e bancos estatais - para que existisse sinergia e consistência no rumo dos investimentos. Também se imaginaram royalties sobre atividades que utilizassem recursos naturais da região e que incidiriam sobre mineração, geração de energia ou o agronegócio. Mas as sugestões de fontes de recursos para o desenvolvimento regional e sustentável da Amazônia se perderam no caminho e no tempo. O PAS ressurgiu subitamente, no começo de maio, em versão conceitual e esquálida. É inspirador e didático ler suas cem páginas de diretrizes que discorrem sobre as diversas nuances da Amazônia. Mas ação, ali, não tem nenhuma.

Do ponto de vista institucional reina uma certa bagunça nesta fase pós-Marina Silva. A presença da ex-ministra dava a impressão romântica que o governo Lula tinha alguém muito sério, determinado e sempre alerta a defender a biodiversidade e os povos da floresta de qualquer perigo - inclusive os criados por ele mesmo. Bastou ela desistir do posto para que se tenha a sensação de que vários flancos estão a descoberto. Afinal quem hoje, dentro do governo, cuida da Amazônia?

Afinal, quem hoje cuida da região dentro do governo?

Carlos Minc ainda não teve tempo de descansar seus coletes na cadeira e mostrar a que veio. Ontem estava em Bonn, em sua primeira aparição internacional como alguém que entrou no "lugar de Pelé", (para ficar na metáfora do chefe). Surgiu na conferência das Nações Unidas sobre biodiversidade justo a tempo de ganhar do Greenpeace o prêmio Motosserra de Ouro, láurea com que a ONG performática costuma brindar os países que travam as negociações. De lá, rumaria direto a Belém, para a reunião com os governadores da Amazônia Legal, sua primeira prova de fogo doméstica.

Estarão à mesa o governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, com quem Minc produziu atrito antes mesmo de assumir, e Ivo Cassol, de Rondônia, outro Estado onde a floresta ameaça tornar-se uma vaga lembrança. O principal ponto da pauta é a discussão do que técnicos do Ministério do Meio Ambiente temem que aconteça, o Planalto acena com a possibilidade e os governadores exigem - a revisão da resolução do Conselho Monetário Nacional que limitará o crédito oficial, a partir de 1º de julho, a produtores rurais que tiverem desmatado além do limite legal, estiverem em situação fundiária irregular e não tiverem procurado consertar toda esta confusão.

Na gestão de Marina Silva, a medida era tida como fundamental para brecar a tendência crescente do desmatamento que está a pleno vapor desde o final do ano passado - e, tudo indica, deve continuar exibindo vigor nos dados de abril que o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais promete divulgar na semana que vem. Ao lado de ações punitivas, a equipe de Marina havia arquitetado medidas que estimulassem quem quisesse corrigir, por assim dizer, desvios de rota amazônica. Na medida provisória que trata da renegociação da dívida rural há a inclusão de dois pontos muito interessantes. Em um deles aparece a figura do penhor florestal - ou seja, o sujeito que quiser crédito para uma atividade madeireira pode dar a floresta como garantia. O outro mira seduzir quem quiser recuperar áreas desmatadas com juros de 4% ao ano, 12 anos de carência e 20 para pagar.

A dúvida, agora, é quem cuidará do quê quando o assunto é Amazônia. Há no Planalto uma zona cinzenta e ambígua nas decisões ambientais. É uma interpretação perversa da transversalidade ambiental tão sonhada por Marina Silva. Que pedaço desta história ficará com o MMA de Minc? O comando do PAS, seja lá o que isso signifique, ficou com o filósofo Mangabeira Unger, e o entendimento que ele dará a isso é uma questão em aberto que pode representar, por exemplo, um canal mais estreito com os governadores amazônicos e o ressurgimento de demandas que o MMA considerava já resolvidas. No âmbito da Integração Nacional, a Sudam, que morreu e renasceu das cinzas, continuará como uma miragem do que poderia ser uma verdadeira agência de fomento regional? E o Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável da rodovia BR-163, tido como uma experiência única do que pode ser um modelo ajustado à região, emperrou ironicamente na pavimentação da estrada e não decola. Por fim, a Casa Civil continuará tendo a última palavra - e a que realmente importa - nas decisões que podem mudar o destino da floresta e das 25 milhões de pessoas que vivem por ali?

Enquanto esta zona de sombras não se dissipa, há algumas certezas sobre o que ocorre na Amazônia até agora. O caminho que se seguiu, de saque e depredação, não está dando bons resultados. O ambientalista Roberto Smeraldi, diretor do Amigos da Terra - Amazônia Brasileira, trabalha há 15 anos com desenvolvimento da região e sabe de cabeça alguns dados perturbadores. A porcentagem da população abaixo da linha da pobreza manteve-se igual entre 1990 e 2005 na Amazônia: 45% da população da região vivendo com menos de US$ 2 ao dia. Em 1990, no Brasil, este índice era de 42% e caiu para 31% em 2005. Em termos absolutos, o número de pessoas vivendo em condições de pobreza na Amazônia cresceu de 7,4 milhões para 10 milhões no período. Que a Amazônia é brasileira, ninguém duvida. Mas precisamos é de um plano B.

Daniela Chiaretti é repórter especial

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Folha - União quer limite a estrangeiro na Amazônia

Por FERNANDA ODILLA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Incra aguarda parecer da Advocacia Geral da União para definir restrições à aquisição de terras por empresas de capital externo

Consultor-geral da AGU diz que empresas estrangeiras têm adquirido "grandes extensões de terras" sem qualquer tipo de restrição

O governo federal vai fechar o cerco à "invasão estrangeira" na Amazônia. Até a próxima semana, o Incra terá em mãos uma solução jurídica para dificultar a compra de terras por empresas brasileiras controladas por capital estrangeiro. Um parecer da Advocacia Geral da União vai fixar limites para essa aquisição, o que hoje não existe.

As regras, que passam a vigorar tão logo fique pronto o parecer, vão valer para todo Brasil. Mas o alvo principal é a Amazônia, onde estão 55% das propriedades do país registradas em nome de estrangeiros: são 3,1 milhões de hectares dos 5,5 milhões de hectares cadastrados no Incra por pessoas físicas e jurídicas de outras nacionalidades. A presença estrangeira pode ser ainda maior, já que os proprietários não são obrigados a identificar a nacionalidade na hora do registro.
"É preciso estabelecer regras urgentes porque há uma disputa mundial pelas terras brasileiras", diz Rolf Hackbart, presidente do Incra. Ele tem repetido que as medidas são necessárias não por uma "questão de xenofobia, mas de soberania".

O desejo do presidente Lula de transformar o Brasil na solução para a crise de alimentos e pólo mundial do biocombustível tem relação direta com as alterações. Segundo Hackbart, o interesse estrangeiro pelas terras nacionais cresceu com a estabilidade econômica do país e a necessidade de produzir alimentos e biocombustíveis.

Faltam porém mecanismos legais para interferir no volume e estoque de terras comprados ou arrendados por empresas com sede no Brasil comandadas por estrangeiros. Desde 1998, o Incra controla apenas a aquisição de imóveis rurais de empresas sem sede ou pessoas físicas não residentes no país.

Caberá à AGU apresentar, na próxima semana, um parecer revisado para restringir a aquisição de imóveis rurais por empresas brasileiras controladas por estrangeiros. O consultor-geral do órgão, Ronaldo Jorge, é o responsável por buscar uma solução jurídica "em nome da soberania nacional".

Desde o ano passado a AGU está revendo o próprio parecer, assinado em 1998 pelo então advogado-geral Geraldo Quintão. Na ocasião a norma foi criada para preencher lacunas na legislação abertas com o fim, na Constituição, da diferença entre empresa nacional de capital estrangeiro e de capital nacional. O parecer eliminou a necessidade de autorização para empresas de estrangeiros com sede no Brasil comprarem imóveis rurais no Brasil.

Em audiência no Senado, em março, o consultor-geral da AGU explicou que o parecer está sendo revisto porque os órgãos governamentais não podem mais controlar as aquisições desse tipo. "Com isso, as empresas estrangeiras se associam a empresas brasileiras, tendo controle do capital social, e adquirem grandes extensões de terras sem que se possa estabelecer qualquer tipo de restrição", disse Ronaldo Jorge.

A Folha apurou que há dois caminhos para dificultar a compra de terras por estrangeiros. A AGU pode revogar o parecer em vigor e fazer valer a legislação de 1971, que diz que estrangeiros não podem ter mais que 25% das terras num só município e precisam registrar a compra com certidão pública. A AGU pode também alegar que, apesar das mudanças na Constituição, permanecem inalterados os artigos da lei 5.709/71 que estendem a empresas controladas pelo capital estrangeiro as mesmas restrições para pessoas jurídicas e físicas do exterior.

A AGU deve indicar ainda a necessidade do Congresso disciplinar os investimentos estrangeiros no país por meio de projeto de lei. Seria a solução para por fim ao fenômeno dos estrangeiros que compram terras usando "laranjas".

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Folha - Teste amazônico

Opinião

"A LEI será cumprida sempre", anunciou Lula na transmissão de cargo no Ministério do Meio Ambiente. Um presidente da República, em situação normal, não sentiria necessidade de repisar o óbvio. Na questão ambiental, contudo, a ambigüidade impera.
Na tentativa de dissimulá-la, Lula reafirmou: não há política de ministro A ou B, mas política de governo. O presidente logo terá oportunidade de demonstrar se fala sério, além de grosso.

Na sexta-feira, em Belém, nove governadores da região amazônica tentarão acordar uma pauta de reivindicações que tende a forçar a definição presidencial. Entre as exigências com chance de sairem consagradas está o adiamento das medidas de cumprimento da lei contidas na resolução nº 3.545 do Conselho Monetário Nacional, de fevereiro.

A exigência de regularização fundiária e de respeito à reserva legal (pela regra em vigor, 80% de cada propriedade na Amazônia) como condição para obter crédito rural pode ter sido inspirada por Marina Silva, mas foi baixada pela Fazenda, pelo Planejamento e pelo Banco Central. Decisão do Planalto, portanto, que fixou o prazo de 1º de julho para cumprir-se a lei: não financiar empreendimento que desobedeça a normas ambientais.

De sexta-feira até lá, resta a Lula um único mês. Terá então de arbitrar entre afrouxar seu torniquete antidesmatamento, reivindicação dos aliados governadores, e manter sua política de governo. Ao decidir, deixará claro qual o peso relativo do MMA na gestão Carlos Minc.

O retrospecto não autoriza prever aumento de influência da pasta. Soou também constrangedor ouvir do presidente o gracejo de que o novo ministro em poucos dias já falou mais que Marina Silva em cinco anos.

Muitos, no lugar de Minc, começariam apreensivos com a possibilidade de terminarem falando sozinhos na defesa da medida que, a julgar pela resistência de desmatadores, prova-se a mais eficaz para coibir a derrubada ilegal. Para escapar dessa armadilha, Minc precisará de algo mais que um colete verde.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Folha - Mangabeira diz ser "um ignorante" em relação à região amazônica

Por IURI DANTAS e MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Ministro afirma que sua missão é reconciliar preservação e desenvolvimento

Escolhido para coordenar o PAS (Plano Amazônia Sustentável), o ministro Mangabeira Unger (Assuntos Estratégicos) não pensou muito quando questionado se conhece suficientemente a região. "Eu me julgo um ignorante", disse.
Mas são muitas as convicções do ministro, a começar por considerar "vazia" a polêmica entre o avanço do agronegócio e a proteção da floresta. Entre o governador Blairo Maggi (MT) e a ex-ministra Marina Silva, Mangabeira foge da opção. Sua missão, descreve, é buscar "reconciliação profunda" entre os pólos do debate. E espera que o novo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, "seja um colaborador meu no futuro".

FOLHA - Qual é o problema da Amazônia?
MANGABEIRA UNGER - Acho que o debate está falsificando a situação real, que é mais interessante, mais grave, mais perturbadora e esperançosa do que o debate sugere. Um número pequeno de brasileiros acha que a Amazônia deve ser preservada como um parque. Um número igualmente pequeno de brasileiros aceita entregar a Amazônia às formas predatórias da atividade econômica. A grande maioria insiste no desenvolvimento sustentável, mas não sabe como conseguir. O problema não é a divisão entre ambientalistas e desenvolvimentistas, o problema é a confusão.

FOLHA - É possível conter o desmatamento sem frear o agronegócio?
MANGABEIRA - Não tem nada a ver com agronegócio. Nosso problema é que não temos feito nem de longe o suficiente nem em matéria de preservação nem em matéria de desenvolvimento. Por isso, estou discutindo intensivamente com os governadores da Amazônia Legal as medidas necessárias para dar conteúdo prático ao desenvolvimento sustentável.

FOLHA - O sr. assumiu o PAS, plano discutido desde 2003. Mas parece que está partindo da estaca zero.

MANGABEIRA - O PAS é um conjunto de diretrizes e compromissos, mas não é uma planilha tecnocrática. Não é um plano de medidas concretas. Há mais de 25 milhões de brasileiros lá. Se não tiverem oportunidades econômicas, serão levados a uma atividade econômica desordenada que provocará o desmatamento.

FOLHA - O sr. está em rota de colisão com Carlos Minc?
MANGABEIRA - Eu nem tive ainda a oportunidade de estar com ele. Eu o vejo como um grande colaborador meu no futuro.

FOLHA - Entre Blairo Maggi e Marina, a quem dá razão?

MANGABEIRA - É natural que haja tensões. Mas é um desserviço acalentar divisões no meio desta neblina. Não estou dizendo que há fórmula mágica. Não tem o menor sentido disputar uma espécie de império que não construímos. Nosso problema é avançar na construção, sem dogmas, sem preconceitos, sem prevenções, neste esforço de produzir reconciliação profunda e duradoura entre preservação e desenvolvimento. Minha tarefa é colocar a imaginação a serviço da eficácia.

FOLHA - O sr. se julga suficientemente informado?

MANGABEIRA - Eu me julgo um ignorante. O que eu sei fazer é construir uma tarefa com pessoas de idéias contrastantes. A premissa da discussão com o mundo a respeito da Amazônia é a reafirmação da nossa soberania. Mas não devemos cultivar uma atitude paranóica.

sábado, 24 de maio de 2008

O Globo - Amazônia, tema para o próximo encontro

Por Cristiane Jungblut e Eliane Oliveira

Lula defende uma agenda conjunta, não ditada pelos europeus

BRASÍLIA. A preservação da Amazônia entrou ontem na agenda da reunião de presidentes da América do Sul, junto a temas como a integração energética e a criação de um Conselho de Defesa Sul-Americano.

Diante das cobranças internacionais motivadas pelo desmatamento da floresta, especialmente na Amazônia brasileira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva manifestou, segundo assessores, preocupação com a questão e defendeu a necessidade de as nações da região assumirem uma posição sobre o tema.

O desejo de Lula é que a próxima reunião da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), criada no encontro de ontem, tenha a Amazônia com um dos principais temas. Na semana passada, ao se reunir com o presidente do Peru, Alan García, Lula foi cobrado por seu colega peruano sobre a falta de mais integração entre os países amazônicos que fazem fronteira com o Brasil. O líder brasileiro concordou.

O assunto surgiu ontem quando Lula conversava com seus colegas sul-americanos sobre biocombustíveis, segurança alimentar e Amazônia. O presidente disse que é preciso que os países amazônicos estabeleçam uma agenda conjunta, para que não sejam pautados pelos europeus. Na Europa, lembrou Lula, há sempre um debate sobre a questão amazônica.

— O presidente considera que é preciso que os países da região não fiquem a reboque dessas posturas internacionais e desenvolvam uma pauta própria — disse uma fonte ligada ao Palácio do Planalto, acrescentando que o desmatamento não pode ser um discurso apenas de países que não fazem parte da região.

O presidente do Equador, Rafael Correa, disse ontem ao GLOBO que concorda com a preocupação de Lula.

Correa destacou que é também preciso desenvolver políticas para proteger os povos indígenas.

— Já estou cansado de ouvir os discursos dos países europeus dizendo que temos de preservar o meio ambiente. São países que acabaram com suas florestas e devem nos compensar por provermos esse bem tão necessário à preservação da vida no planeta — afirmou o equatoriano. (Cristiane Jungblut e Eliane Oliveira)

sexta-feira, 23 de maio de 2008

OESP - Mato Grosso contesta dados do Inpe

Por Nelson Francisco, CUIABÁ

Blairo Maggi duvida de números anunciados pelo ministro Carlos Minc, que apontam aumento do desmate

Os últimos números de desmatamento na Amazônia Legal só devem ser divulgados oficialmente na segunda-feira, mas o governo de Mato Grosso já contesta sua precisão. O governador Blairo Maggi (PR) disse ontem duvidar que o desmatamento tenha aumentado 60% no Estado, como disse na véspera o novo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, com base em informações do Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe). Em nota, o governo de Mato Grosso informou que os dados do Inpe serão verificados porque sempre apresentam “distorção”.

Para tentar conter a crise entre Minc e Blairo, a expectativa, segundo o governo de Mato Grosso, é que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva chame ambos para conversar nos próximos dias. Antes mesmo de tomar posse, Minc “elegeu” Blairo como inimigo da floresta em declarações sobre desmatamento ilegal, rebatidas sempre pelo governador. O substituto de Marina Silva chegou a dizer que Blairo plantaria soja “até nos Andes” se pudesse.

“Ainda não conheço os números e acredito que vamos continuar tendo uma redução em relação à média do ano anterior. Se formos olhar o que vem acontecendo desde 2005, todos foram anos em que nós tivemos uma redução bastante grande do desmatamento”, disse Blairo. “A pressão sobre Mato Grosso é maior do que nos outros Estados, até porque temos uma agricultura muito forte e uma pecuária mais forte ainda. Mas isso também não nos dá o direito de aceitar o que está errado.”

Em nota divulgada ontem, o governo de Mato Grosso abriu nova polêmica com o Inpe. “Como acontece todas as vezes que o Inpe divulga dados sobre o desmatamento na Amazônia, a fiscalização da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) sai a campo para verificar ponto a ponto os dados divulgados referentes a Mato Grosso. O trabalho dos fiscais tem mostrado que os números do Inpe apresentam uma distorção, já que, em geral, os porcentuais de desmatamento verificados in loco em Mato Grosso são menores, como o próprio Inpe já admitiu”, afirmava o texto.

Segundo a nota, a discrepância de número ocorre porque o Sistema de Detecção em Tempo Real (Deter), usado pelo Inpe, emite alertas de desmatamento para qualquer modificação da floresta. “Assim, antigas áreas já desmatadas, leitos de rios, ou até afloramentos rochosos são identificados como desmatamento. Isso já foi comunicado ao Inpe para que corrija tais distorções. Diante de relatório emitido pela Sema, entregue (em março) a ministros e ao próprio presidente, o próprio Inpe admitiu que os dados referentes aos três últimos meses de 2007 não estavam corretos.”

Blairo classificou os dados do Inpe como “mascarados” e precipitados. “Sempre que desmatamentos ilegais são detectados no Estado, por equipes de fiscalização da Sema, o governo age com rigor, embargando propriedades e multando proprietários. Como foi feito recentemente com o embargo de oito propriedades, com cerca de 15 mil hectares, que acarretou aos infratores multas de aproximadamente R$ 4,5 milhões, de acordo com a legislação ambiental em vigor”, informa a nota divulgada pelo governo.

Procurado pelo Estado, o Inpe não quis comentar as declarações. Em nota divulgada no início do mês, o instituto rebateu as contestações sobre os dados dos últimos três meses de 2007.

Segundo a Sema, verificações de campo de 662 pontos indicados como desmatados pelo Deter teriam revelado que em apenas 10% deles a floresta havia sido de fato derrubada. O Inpe analisou 854 imagens entregues pela secretaria e concluiu que 313 eram repetidas, 78 estavam distantes do local de alerta, 45 não correspondiam às áreas detectadas pelo Deter e 65 eram “não informativas”, tiradas de muito perto. Das 353 consideradas válidas, concluiu-se que quase todas (96,4%) eram de desmatamento - o oposto da avaliação da Sema.

Não é a primeira vez que Blairo entra em confronto direto com o Inpe. Em janeiro, quando o instituto divulgou os números referentes ao período entre agosto e dezembro de 2007, ele também contestou os dados. “O Inpe está mentindo a serviço de alguém. Queremos saber a serviço de quem”, disse.

FRASES

Blairo Maggi
Governador de Mato Grosso

“O trabalho dos fiscais tem mostrado que os números do Inpe apresentam uma distorção (...) os porcentuais de desmatamento verificados in loco em Mato grosso são menores, como o próprio Inpe já admitiu”

“Não conte com a nossa polícia. Já temos pouco efetivo para cuidar do povo. Não tenho soldados para proteger a floresta”

Carlos Minc
Ministro do Meio Ambiente

“A partir de agora o Blairo não deve brigar comigo, deve brigar com o presidente Lula, que já bateu o martelo (sobre a criação da força com policiais e bombeiros dos Estados)”

OESP - Que pode mudar no meio ambiente?

Artigo
Washington Novaes

É quase impossível acreditar que não figurasse nas possibilidades antevistas pelo presidente da República - ao nomear outro ministro para coordenar o Plano Amazônia Sustentável, sem o conhecimento e a concordância da ex-ministra Marina Silva - a possibilidade de esta se demitir do Meio Ambiente. Por que terá ele escolhido esse caminho? Com o propósito de forçar sua saída? É possível que assim tenha sido. Para evitar, por exemplo, atritos com vários governadores (Mato Grosso, Rondônia, Pará) e com a quase totalidade da corporação político-econômica da Amazônia, com ela em confronto, em ano eleitoral. Há quem acredite que entre as razões se incluiria o início do processo de licenciamento da hidrelétrica de Belo Monte, no Baixo Xingu, mais problemática que as do Rio Madeira (basta ver o primeiro conflito com índios que protestavam esta semana contra a usina, entre eles a índia Tuíra, que, no final da década de 80, quando se discutia o mesmo projeto, encostou um facão no pescoço de um diretor da Eletronorte). Há também quem suponha que se tratou de prevenir um confronto com áreas militares no caso da demarcação contínua da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em que já se antevê possibilidade de algum recuo do governo federal. Há quem veja a oposição da ministra à usina de Angra 3 e a outras nucleares que o governo decidiu implantar.

E que acontecerá a partir da saída da ministra e da ascensão de Carlos Minc? Será complicado. O presidente já decidiu manter na coordenação-geral do Plano Amazônia Sustentável o ministro Mangabeira Unger, e não outra pessoa, como anunciara o novo ministro. Não haverá novos recursos para chegar ao “desmatamento zero” naquele bioma (foi negada a Minc a liberação de R$ 1 bilhão contingenciados de royalties de hidrelétricas e empresas de saneamento) - e isso quando o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais confirma o aumento em curso do desmatamento e quando o Ministério continua a contar com pouco mais de 0,5% do orçamento federal para todas as suas atividades, inclusive a de montar estruturas de regulação fundiária, monitoramento e fiscalização em milhões de quilômetros quadrados. Será difícil ainda obter apoio do Executivo no Congresso para impedir que ali se aprovem medidas como o projeto que, na prática, reduziria de 80% para 50% em cada propriedade a reserva legal em áreas de florestas. E ainda ter fôlego para a discussão sobre asfaltamento da BR-163, saneamento, “transversalidade” no governo. É muito.

Pode-se tentar ver mais de perto o licenciamento da hidrelétrica de Belo Monte, projetada para gerar 11,5 mil MW, mas que, segundo especialistas, na época de seca só teria água para 4,6 mil MW (o que levaria, após o primeiro licenciamento, à estratégia de implantar outros reservatórios de novas hidrelétricas a montante, no mesmo rio, para garantir o armazenamento de água para a estiagem). Outros argumentos têm sido alinhados, como o da desnecessidade dessa implantação, diante de estudos que mostram a possibilidade de reduzir em até 50% o consumo nacional de energia, com investimento muitas vezes menor. A tecnologia de bulbos, prevista para a obra, também seria temerária.

O problema maior da ex-ministra parece haver sido o retorno de taxas maiores de desmatamento na Amazônia, embora muitos críticos atribuam a queda anterior não a méritos do Ministério do Meio Ambiente, mas em grande parte à baixa das cotações da soja e da pecuária durante três anos. Mas ela sofreu também derrotas em temas nos quais a posição de seu Ministério era a mais adequada para o País. Por exemplo, na aprovação dos alimentos transgênicos, com derrota no Congresso articulada pelo próprio Executivo e pelo partido a que pertence a ex-ministra. Ou na importação de pneus usados, em que prevaleceu a posição do Itamaraty. Ou no licenciamento (por um Ibama retalhado) das hidrelétricas do Rio Madeira, exigido pelo Ministério de Minas e Energia. Poderiam até ser motivo de orgulho para a ex-ministra essas derrotas. O problema está em haver aceitado derrotas articuladas por seus aliados no mais alto nível.

Há outros pontos questionáveis. Na transposição de águas do São Francisco, por exemplo, quando a ex-ministra deu entrevistas aprovando o projeto antes de licenciado pelo Ibama, a ela subordinado. Também no projeto de lei de gestão de florestas públicas, que recebeu críticas contundentes de muitos cientistas, nunca respondidas. Ou ainda na decisão de repassar a competência para licenciar desmatamentos a governos estaduais que não têm estruturas para tanto e são mais vulneráveis a pressões políticas e econômicas locais (o novo ministro anunciou que pretende continuar com essa política). Em alguns dos Estados onde houve o repasse, como Mato Grosso, Rondônia, Pará, o desmatamento voltou a crescer.

Ainda seria possível mencionar que se levou anos para criar no Ministério uma secretaria de mudanças do clima e que ainda não temos política definida para essa área crucial, fortemente relacionada com a Amazônia, já que 75% das nossas emissões, que nos colocam como o quarto país mais poluente, se devem a desmatamentos, queimadas e mudanças no uso da terra. Da mesma forma, a escassez de ações no bioma Cerrado, que está perdendo 22 mil quilômetros quadrados por ano.

Mais difícil que tudo, provavelmente, será conseguir o novo ministro que o País tenha uma estratégia territorial que lhe permita não apenas formular uma política adequada para a Amazônia, o Cerrado, o clima, mas principalmente colocar recursos e serviços naturais como o centro de todo o planejamento brasileiro. Eles - tem sido dito aqui - são hoje o fator escasso no mundo: biodiversidade, território, insolação, recursos hídricos, energias renováveis, “limpas” e alternativas (solar, eólica, marés, biomassas). São a nossa melhor possibilidade.

Washington Novaes é jornalista

O Globo - Modernização produtiva na Amazônia

Coluna Negócios & Cia
Por Flávia Oliveira

O novo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, planeja usar linhas de financiamento do BNDES para modernizar, aumentar a eficiência e reduzir os danos das atividades produtivas na Amazônia.

Minc já classificou dois setores como prioritários: a indústria madeireira e os produtores de óleo vegetal.

Nas próximas semanas, ele vai se reunir com representantes da Associação das Indústrias Madeireiras do Estado do Pará (Aimex) e da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) para apresentar a proposta. O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, também será procurado.
Minc vai pedir a ele um aporte especial do Finame (linha de crédito para máquinas e equipamentos) para reformular o modelo de produção dos dois setores.

— Vamos separar setores predatórios dos produtivos. Os madeireiros e os produtores de óleo podem ser nossos aliados na proteção da Amazônia, se entenderem os ganhos que terão com a modernização de suas atividades.
Eles podem ajudar a proteger a floresta da soja — disse o futuro ministro, em mais uma crítica ao desmatamento provocado pela expansão da fronteira agrícola.
Minc quer usar recursos públicos para financiar o reaparelhamento das indústrias, a formação da mão-de-obra e a capacitação dos empresários: — De cada dez árvores derrubadas na Amazônia, apenas três chegam ao mercado. O desperdício e a ineficiência são imensos.

Vamos ganhar com a modernização das atividades e a certificação da madeira e do óleo. Há empresários que não querem se associar à destruição da floresta.
Esses terão tratamento diferente.
E completa: — Agora, quem não quiser se modernizar vai se acertar com a Polícia Federal. E ficará cinco anos plantando manguezal, recuperando a floresta que ajudou a destruir.

Minc vai propor ao BNDES uso de recursos do Finame para reaparelhar madeireiras

quinta-feira, 22 de maio de 2008

OESP - 'Amazônia não está à venda'

Por Denise Chrispim Marin, BRASÍLIA

Para ministro Amorim, ascensão do País suscita crítica

A “elite oligárquica” internacional está se opondo à ascensão do Brasil no cenário mundial. Os disparos contra a política brasileira para a proteção ambiental na Amazônia, a expansão da produção de biocombustíveis e as violações aos direitos humanos no País devem ser lidas como algumas dessas reações e também como “falsos problemas”. Essa defesa foi feita ontem pelo ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, à imprensa, ao final de uma exposição aos representantes brasileiros no Parlamento do Mercosul. Para ele, o País terá de se acostumar a receber ataques.

“Não quero dizer que haja uma teoria conspiratória. Mas há setores que se incomodam quando surge um país que pode mexer na ordem mundial, como o Brasil vai mexer, e positivamente. Isso incomoda estruturas acostumadas a um certo modo de dominação, que formam uma elite oligárquica nas relações internacionais”, disse ele.

E completou: “Há um jogo de poder no mundo, e o Brasil está emergindo. Há resistências, e vamos ter de nos acostumar com isso. Vamos ter problemas comerciais, com as questões de biocombustíveis, as questões da Amazônia e teremos de enfrentar questões relativas a padrões sociais e de direitos humanos.”

A posição de Amorim sobre esse jogo de poder reflete, em parte, o resultado da primeira reunião de chanceleres de países apontados como potências futuras - o chamado grupo BRIC, composto por Brasil, China, Índia e Rússia -, que se deu na cidade russa de Ekaterimburg no último dia 16. O evento foi considerado um sucesso pela cúpula do Itamaraty, que acredita no potencial do grupo de mudar a forma como o mundo hoje está organizado.

Isoladamente, cada um dos quatro países apresenta estofo para alterar tópicos da ordem mundial. Coordenados, serão uma nova força no jogo de poder internacional.

Abordado sobre os ataques às políticas brasileiras sobre os biocombustíveis e a defesa do meio ambiente, Amorim tomou emprestado conceitos que levou à organização do encontro de Ekaterimburg. Primeiro, defendeu que “o meio ambiente talvez seja o maior patrimônio brasileiro” e que, diferentemente dos países que devastaram suas áreas naturais, a natureza pode ser vista em qualquer lugar do Brasil. Depois, lembrou que ninguém nunca questionou o uso que os Estados Unidos fazem de suas reservas petrolíferas no Texas, embora muitos queiram apontar limites para a exploração da Amazônia.

“A Amazônia não está à venda. Queremos preservar nossa soberania”, declarou. “Mas, ao mesmo tempo, o Brasil tem interesse em melhorar as condições de vida de seus trabalhadores, tanto dos que estão na Amazônia quanto dos que estão nos canaviais”, completou.

OESP - Minc diz que desmatamento cresceu

Por Felipe Werneck, RIO

Sem citar dados, novo ministro provoca governador Maggi: ‘Para variar, mais de 60% em qual Estado? Mato Grosso’

A seis dias de assumir oficialmente o ministério do Meio Ambiente, Carlos Minc afirmou ontem que o desmatamento na Amazônia aumentou em abril. Sem divulgar todos os dados, provocou o governador Blairo Maggi (PR), aliado do governo, citando Mato Grosso como um dos responsáveis pela alta da devastação. Ao comentar uma entrevista do governador, contrário à proposta de ceder funcionários do Estado para a criação da Força Nacional Florestal, sugerida por Minc ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o futuro ministro disse: “Vai ser um dado ruim, um dado de aumento (do desmatamento). E, para variar, mais de 60% em qual Estado? Quem sabe? Mato Grosso”, disse Minc, no Rio.

Maggi não se manifestou sobre as declarações de Minc. Informou apenas que aguardará a divulgação, na segunda-feira, do relatório sobre desmatamento na Amazônia feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O governo de Mato Grosso prepara um outro estudo para rebater as informações sobre o aumento. Relatório da Secretaria Estadual de Meio Ambiente apontará, porém, que os novos desmates caíram 80% no primeiro bimestre de 2008 em comparação ao mesmo período de 2007.

O pesquisador do Imazon Adalberto Veríssimo diz que o aumento anunciado pelo ministro não surpreende, pois segue a tendência de crescimento do índice de desmatamento observada desde agosto de 2007. “Este ano está sendo difícil para a Amazônia, as medidas tomadas pelo governo para combater a devastação, apesar de duras, são ainda insuficientes. (...) Os dados do INPE confirmam que não é possível flexibilizar as normas, como pede o governador de Mato Grosso”, diz Veríssimo.

Para Minc, há um “certo egoísmo” de Maggi, considerado o maior produtor de soja. Anteontem, após reunião com o coordenador do Plano Amazônia Sustentável (PAS), ministro Mangabeira Unger, o governador de Mato Grosso declarou, em entrevista ao jornal O Globo: “Acho até que pode criar (guarda florestal). Mas não conte com a nossa polícia. Já temos pouco efetivo para cuidar do povo. Não tenho soldados para proteger a floresta. Tragam gente do Sul, Curitiba, Porto Alegre.”

Minc afirmou que Maggi, como todo homem público, “tem que assumir suas responsabilidades”. Ele disse ter achado “curioso” o fato de o governador se dizer favorável à criação da tropa, mas recusar ajuda. “A partir de agora o Blairo não deve brigar comigo, deve brigar com o presidente Lula, que já bateu o martelo (sobre a criação da força, com policiais e bombeiros dos Estados).” Ao chegar à sede da Secretaria de Estado do Ambiente no Rio, que chefiava, o futuro ministro, cuja posse está marcada para terça, brincou: “Vocês querem saber se o Blairo Maggi vai ser o comandante da minha Força Nacional Florestal?” O comandante da futura tropa será o tenente-coronel José Maurício Padrone, até ontem responsável pela Coordenadoria Integrada de Combate aos Crimes Ambientais, da secretaria fluminense.

Na entrevista, Minc também procurou demonstrar tom conciliador. “Não quero impor nada a ninguém. Estou chegando agora, ainda nem tomei posse. Não quero criar esse tipo de polêmica.” Após ter o seu nome indicado para o ministério, Minc já havia criado polêmica com o governador ao afirmar que, se deixassem, Maggi “plantaria soja até nos Andes”. Na ocasião, Maggi disse considerar as declarações “descabidas, inoportunas, extemporâneas e impróprias”.

PROPOSTAS

O novo ministro disse que um zoneamento econômico-ecológico com regras claras será o “canal de diálogo” com o agronegócio. Ele afirmou que irá “tratar diferentemente setores mais avançados”, sem especificá-los. “Hoje em dia temos um setor que depende de ter toda a sua cadeia produtiva auditada a carimbada para conseguir vender no exterior. Esse, quer o diálogo. E tem outro, atrasadíssimo, que está convertendo a Amazônia em pasto. Primeiro tira árvore, depois põe o gado, e depois alguns colocam a sua sojinha.”

Minc irá à Alemanha no dia 29 e disse que voltará com 150 milhões de euros para o programa de Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa) - a visita foi agendada na gestão de Marina Silva. “Lá, vou tentar lançar o Arpama, de áreas protegidas da mata atlântica.” Reafirmou que o licenciamento ambiental será “agilizado, com todo o rigor”, pelo novo presidente do Ibama, Roberto Messias. “É claro que a orientação é essa. Ele vai fazer exatamente isso. Sou ligeiramente maluco, mas não tanto assim.” Adversário da energia nuclear, Minc disse que o licenciamento de Angra 3 será “técnico”.

COLABOROU NELSON FRANCISCO

quarta-feira, 21 de maio de 2008

OESP - Stephanes critica portaria que amplia área amazônica

Por Fabíola Salvador, BRASÍLIA

O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, afirmou ontem, em audiência com o presidente da Federação da Agricultura do Estado do Paraná, Ágide Meneguette, que está “preocupado” com os reflexos da Portaria 96 do Ministério do Meio Ambiente, que ampliou a lista de municípios incluídos no bioma amazônico (que terão restrições ambientais), segundo relato de Meneguette.

O ministro disse, segundo o presidente da federação, que “o caminho precisa ser feito para que a portaria seja revista e que é preciso haver um bom esclarecimento sobre o assunto”. “A portaria é inconstitucional”, avaliou Meneguette. Questionado se o ministro teria dito que vai procurar o ministro indicado do Meio Ambiente, Carlos Minc, para discutir essa e outras questões consideradas pela iniciativa privada um entrave para o agronegócio, Meneguette disse que Stephanes não foi claro. “Ele não falou claramente, mas como é homem de bom senso, certamente fará.”

Representantes da bancada ruralista da Câmara enumeram uma lista de reivindicações que, segundo eles, deveriam ser apresentadas por Stephanes a Minc. Eles também querem audiência com o ministros indicado para “abrir o diálogo”. Além da Portaria 96, eles pedem a revisão do Decreto 6.321/07, do Meio Ambiente, que relaciona 36 municípios da Amazônia Legal, 19 deles em Mato Grosso, como responsáveis pelo aumento do desmatamento na região.

Produtores dessas regiões que tenham desmatado acima do permitido não terão direito a crédito oficial. Parlamentares e representantes da iniciativa privada questionam se a regra vale para quem desmatou antes da vigência dos 80% de Reserva Legal que devem ser preservados na Amazônia, já que este porcentual passou a valer apenas a partir de 1996.

terça-feira, 20 de maio de 2008

OESP - Força Aérea faz vigilância diária da Amazônia

Por Roberto Godoy

Jatos monitoram desmatamento

A aviação militar do Brasil mantém no ar, todo os dias, desde 2002, o aparato de vigilância que Carlos Minc quer propor como parte do envolvimento das Forças Armadas na proteção de parques nacionais e da Amazônia.

A partir da base aérea de Anápolis, a 140 quilômetros de Brasília, grandes jatos R-99 Bravo do Esquadrão Guardião realizam sua missão cotidiana de coleta de dados e imagens de incêndios florestais, das superfícies desmatadas e em processo de desmatamento, de áreas de conservação, atividades irregulares de garimpagem, mineração ou demarcação de terras. Não é só. O grupo, comandado pelo tenente-coronel Rinaldo Nery, acompanha a movimentação das reservas indígenas e das zonas de proteção ambiental. Também produz dados para a elaboração do Plano Permanente de Zoneamento Ecológico e Econômico.

Os olhos e ouvidos eletrônicos estão voltados também à observação de atividades e empreendimentos causadores de degradação ambiental envolvendo grandes obras públicas, empreendimentos agropecuários e o trabalho em reservas extrativistas.

As informações são colhidas e podem ser transferidas em tempo real para os centros terrestres. Desse ponto em diante o uso do material fica por conta de setores especializados do governo federal, subordinados à Casa Civil e ao Ministério da Defesa.

Nery tem oito aviões disponíveis. Cada um custa cerca de US$ 80 milhões. Cinco deles são do tipo R-99 Alfa, de alerta antecipado e comando aerotransportado. Levam uma grande antena Erieye, comprada na Suécia. O equipamento pesa quase uma tonelada e tem alcance no limite entre 360 e 400 quilômetros. Com ele a Força Aérea Brasileira (FAB) pode multiplicar o poder de sua frota por meio de coordenação e integração e da capacidade de localizar alvos mesmo quando o deslocamento das aeronaves adversárias se dá a baixa altura.

O segundo time Guardião, guarnecido com três unidades da versão R-99 Bravo, é o que serve diretamente aos interesses ambientais e à vigilância da Amazônia. A rigor, é um avião espião, destinado a missões de inteligência. O principal componente embarcado é o radar de abertura sintética, que permite uma varredura de área feita de forma a não revelar a presença do R-99B.

Com ele atuam um produtor de imagens digitais e um sensor ótico infravermelho, para visão noturna. A partir do ponto de decolagem a aeronave terá duas horas de coleta de dados sobre 57 mil km² a cerca de mil quilômetros de distância. Os jatos operam dia e noite e sob quaisquer condições meteorológicas.

O R-99A/B é construído pela Embraer, em São José dos Campos. Com um deles, do tipo B, o Esquadrão Guardião realizou uma façanha militar, em junho de 2003.

O jato decolou de Anápolis com a missão - negociada diretamente pelo presidente Lula com seu então colega do Peru, Alejandro Toledo - de apoiar uma ação de resgate de 74 reféns tomados pela guerrilha na província de Ayacucho. A maioria funcionários da empresa Techint, que construía um oleoduto.

Duas horas de vôo sobre a mata foram suficientes para monitorar as comunicações entre os seqüestradores e assim definir a localização do cativeiro. Forças Especiais do Exército peruano chegaram ao local em 45 minutos..

segunda-feira, 19 de maio de 2008

OESP - Militares em parques e reservas

Por Cássio Bruno

Minc vai propor hoje a Lula que Forças Armadas ocupem áreas de preservação

Onovo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, disse ontem que vai propor ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva o uso das Forças Armadas — em especial o Exército — no patrulhamento de parques nacionais e reservas extrativistas, principalmente na Amazônia. Essa é uma das dez propostas que Minc levará a Lula na audiência que os dois terão hoje à tarde em Brasília.

Segundo Minc, a iniciativa é parecida com o projeto já adotado no Estado do Rio, os chamados guardas-parques, formados pelo Corpo de Bombeiros e criados em dezembro pelo governador Sérgio Cabral (PMDB).

— Vou propor a criação de destacamentos ou a alocação de regimentos das Forças Armadas para funcionar dentro dos grandes parques e também nas reservas extrativistas — disse Minc ao desembarcar no Aeroporto Internacional Tom Jobim, vindo de Paris.

O ministro chegou querendo mudar a impressão de arrogância que causou a assessores de Lula. A entrevista coletiva concedida por ele, na sexta-feira, em Paris, causou desconforto no Planalto. Minc disse aos jornalistas brasileiros e estrangeiros ter aceitado “em tese” o convite do presidente e que Lula não o fará “pagar um Minc leão dourado”. Um dos interlocutores atribuiu as declarações do novo ministro “a seu jeito folclórico”.

— Na verdade, são muito mais condições que foram postas a Lula. Sérgio Cabral me deu condições excepcionais. Coloquei com honestidade, ao contrário da arrogância. Arrogância seria pensar que eu pudesse enfrentar o problema ambiental do Brasil, cem vezes mais complicado que os do Rio de Janeiro, sem ter o mínimo de condições de trabalho.

Arrogância seria se eu me achasse um SuperMinc, tendo ou não tendo condições. Sem condições não se resolve — explicou Minc.

Ele insistiu que precisa de garantias e que o meio ambiente precisa participar da política tecnológica e da política econômica: — Se eu não tiver condições administrativas, financeiras e políticas, vai ser grande a frustração para mim e para o presidente.

Novo ministro foge de polêmica e elogia PAS

Por outro lado, Minc preferiu não criar mais polêmica em relação ao Programa Amazônia Sustentável (PAS). Um dos estopins para a saída de Marina Silva do Meio Ambiente foi justamente a escolha do ministro do Núcleo de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, para coordenar o projeto. Minc elogiou o programa e Mangabeira.

— O presidente Lula atribuiu a ele a idéia de pensar o plano para o futuro globalmente.

Não é uma coisa absolutamente má. Mangabeira está treinado para isso. Mas quero incorporar ao PAS o Plano de Desmatamento Zero em sete anos, que é um projeto elaborado por algumas ONGs e fundações, com recursos internacionais e alternativas para diminuir o desmatamento — disse Minc, que, antes do encontro com Lula, às 17h30m, vai almoçar com Marina Silva.

Em resposta às críticas de ruralistas de que seria um “ambientalista de Copacabana”, Minc disse que, no exterior, sentiu o impacto da saída de Marina, e teve de afirmar a jornalistas estrangeiros que a Amazônia não viraria carvão.

— Se eu fosse elogiado pelos ruralistas, ficaria preocupado. Com o afastamento de Marina, a primeira sinalização foi de que a Amazônia está sem defesa. A defensora da Amazônia saiu e, agora, ela está entregue. A imprensa da França quis saber qual a garantia que eu tenho de que a Amazônia não será devastada, já que sua principal defensora jogou a toalha. Eu, que não pedi para ser ministro, disse por que a Amazônia não ia virar carvão: a gente vai manter a política de Marina e boa parte dos quadros dela — disse Minc.

Ele mostrou-se preocupado por ser chamado de agilizador de licenças ambientais. Em sua gestão no Rio, foram liberadas 2.068 licenças.

— Você pode ser rápido e rigoroso. Não é porque um licenciamento demora três anos que isso é garantia de defesa dos ecossistemas. Podem ficar três anos enrolando com a burocracia e ser um licenciamento frouxo — disse Minc, citando o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, que recebeu licença em seis meses.

Minc não descartou a possibilidade de convidar o ex-governador do Acre Jorge Viana (PT) para trabalhar na sua equipe. O petista recusara a proposta para o de ministro: — Acho que Jorge Viana tem muito mais condições de ser ministro do que eu, já foi governador, conhece a Amazônia muito bem, tem trânsito com outros partidos.

Ontem Minc se reuniu num restaurante com sua equipe, que incluiu a presidente da Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (Serla), Marilene Ramos; o presidente do Instituto Estadual de Florestas do Rio (IEF), André Ilha; e o presidente da Feema, Axel Grael.

Pelo menos Marilene e a subsecretária Isabella Mônica Teixeira devem ir para Brasília.

OESP - Governo já cogitava proposta

Adriana Fernandes, BRASÍLIA

Idéia de uma Força Ambiental ganhou fôlego este ano

Antes mesmo de o ministro indicado para o Meio Ambiente, Carlos Minc, propor ontem o uso das Forças Armadas na proteção de parques e reservas da Amazônia, a criação de uma Força Nacional de Segurança Ambiental já estava em discussão dentro do governo. Nos moldes da Força Nacional de Segurança, os integrantes da nova força seriam treinados especificamente para atuar nas ações de combate ao desmatamento.

A idéia ganhou força com o teste que vem sendo feito na Operação Arco de Fogo, lançada este ano pelo governo federal para patrulhar a Amazônia e deter o desmatamento. A operação em andamento tem apoio de vários setores e conta também com 300 homens da Força Nacional de Segurança, formada por policiais militares.

Já o uso de militares das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) diretamente nas operações de fiscalização e enfrentamento do desmatamento exigiria mudanças na legislação, segundo o ex-consultor jurídico do Ministério do Meio Ambiente Gustavo Trindade.

Hoje, os militares das Forças Armadas integram as operações de combate ao desmatamento apenas com o apoio logístico e de infra-estrutura. “Os militares das Forças Armadas não têm competência legal para atuar na fiscalização. Será preciso mudar a legislação”, disse Trindade, do escritório Trindade Associados, especializado na área ambiental.

Para o secretário-geral do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), Pedro Leitão, a proposta de Minc é bem-vinda. “As Forças Armadas poderiam ser extremamente úteis no apoio à fiscalização de áreas protegidas. Mas é preciso evitar que elas sejam envolvidas no trabalho de rotina da administração”, disse Leitão.

Ele avalia, no entanto, que será preciso garantir mais recursos e equipamentos para os militares atuarem nessa função. O dirigente do Funbio afirmou que um procurador do Amapá já contatou a entidade para ajudar na formulação de um projeto de um fundo de apoio às operações das Forças Armadas em áreas de conservação.

OESP - Minc pede ajuda militar contra o desmatamento na Amazônia


Fabiana Cimieri, RIO

Indicado para vaga de Marina leva hoje 10 propostas a Lula; a primeira é atuação das Forças Armadas em reservas

O ministro indicado para o Meio Ambiente, Carlos Minc, que se reúne hoje com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, disse ontem que a primeira das dez propostas que fará é a participação das Forças Armadas na defesa dos parques nacionais e das reservas extrativistas da Amazônia. “É um replique do que fizemos com os bombeiros nas unidades de conservação do Rio”, afirmou, ao desembarcar no Aeroporto Tom Jobim.

“Vou propor isso ao Exército, que se criem destacamentos, que se aloquem alguns regimentos das Forças Armadas para funcionar dentro dos parques nacionais, cuidando também do entorno deles e das reservas extrativistas.” Num primeiro momento, Minc afirmou que apresentaria “dez condições”. Questionado sobre quantas seriam necessárias Lula acatar para aceitar o cargo, o secretário de Estado do Ambiente do Rio mudou o tom, disse que seria “indelicado” impor condições e passou a chamá-las de “propostas”.

Para Minc, que estava em Paris quando recebeu o convite para substituir Marina Silva no ministério, a saída dela, no dia 13, deixou na opinião pública internacional a impressão de que “a Amazônia está entregue”. Ele reafirmou que a floresta “não vai virar carvão” porque irá manter a política ambiental e os principais quadros técnicos da gestão de Marina, com quem tem encontro marcado em Brasília, antes da reunião com Lula. Trouxe de presente de viagem para ela uma blusa de seda verde e elogios rasgados: “Mesmo que eu fique dez anos no governo, não vou conhecer metade da Amazônia como ela conhece”.

Sobre o ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, cuja atribuição de executar o Plano da Amazônia Sustentável (PAS) teria sido a gota d’água para a saída de Marina, Minc vai sugerir a Lula que ele analise o projeto “para o futuro, globalmente” e coloque um coordenador-executivo que seja um gestor local. “Eu sei como é isso, a pessoa tem que ficar lá gerindo a cada momento a questão da grilagem, do desmatamento, das alternativas, não criminalizar toda atividade econômica.” Sugeriu o ex-governador do Acre Jorge Viana para a função - “que tem mais competência e trânsito político do que eu” -, mas disse já saber que ele não aceitará.

Minc afirmou não ter se abalado com as críticas dos ruralistas, de que não teria conhecimento da Amazônia por ser um “ecologista de Copacabana”. “Se eu fosse elogiado pelos ruralistas, ficaria um pouco preocupado.” Para ele, que disse ter aceitado o cargo por “pequenas pressões, principalmente do governador Sérgio Cabral”, Lula ficou impressionado com a desburocratização do licenciamento ambiental no Estado. Mas alertou: “Acho que isso encheu os olhos do presidente. Mas talvez ele não saiba o resto da história: para fazer isso tudo tem que ter autonomia, poder e dinheiro”.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

PRIMEIRA ENTREVISTA

“A idéia de arrogância (na entrevista em Paris) veio do fato de eu ter colocado condições de trabalho, mas na verdade são muito mais do que as que foram colocadas. Arrogância seria imaginar que eu pudesse desempenhar uma missão para a qual eu tenho dúvidas se estou à altura, sem ter condições de trabalho.”

DESAFIOS

“Do ponto de vista do planeta, da opinião pública internacional e do trauma que ocasionou a saída da Marina, sem dúvida nenhuma a Amazônia está no centro das questões. Não sou um grande conhecedor, embora minha tese de doutorado seja sobre a Amazônia, mas vou me cercar dos melhores especialistas, muitos deles da equipe da Marina. Por isso segunda-feira (hoje), antes de conversar com o presidente Lula, vou conversar com Marina e equipe. Mas quero colocar outros pontos também como prioridade. Na Amazônia moram 25 milhões de pessoas que precisam de condições dignas de sobreviver sem destruir a floresta. Também pretendo colocar na pauta a questão urbana e industrial. A questão de tecnologia limpa, padrões de emissão, plano de saneamento, transformar lixo em energia.”

EXÉRCITO

“A primeira das dez coisas que eu vou propor é um replique do que fizemos com os bombeiros nas unidades de conservação do Rio. Tínhamos unidades de conservação que, comparadas às da Amazônia, são ridículas, que eram cuidadas por dois funcionários do Instituto Estadual de Florestas. Convencemos o Sérgio Cabral a criar os guardas-parques, que é um destacamento dos bombeiros lotados dentro das unidades de conservação.”

LICENCIAMENTOS

“O que mais agradou ao camarada Lula foi a questão da agilidade do licenciamento ambiental.Tínhamos uma pilha de 15 mil licenças. Onde tem uma pilha dessas, tem burocracia e corrupção. O primeiro passo foi descentralizar. Não é porque um licenciamento demora três anos que isso é garantia de que ele será um instrumento de defesa da vida e dos ecobiomas.”

REPERCUSSÃO

“Como eu sou um ambientalista e vou ser duro nessa área, não espero ser aplaudido de pé pelos grandes desmatadores. O fato de alguém que sinta a pressão do controle ambiental não vibrar com a minha escolha é normal. O cara (Blairo Maggi) é o próprio governador, manda na polícia, mas todos têm que ter limites. Mas para contentar um pouco o pessoal do agribusiness eu poderia dizer o seguinte: nós, os ecochatos de plantão, também temos que ter bom senso. Se fôssemos muito fortes há 80 anos, provavelmente não haveria Pão de Açúcar e Corcovado.”

DESMATAMENTO ZERO

“Sou favorável à adoção de metas para o desmatamento zero em sete anos. Mas acho que isso deve ser um produto do desenvolvimento de atividades econômicas alternativas. Cabe ao governo e à comunidade científica organizarem alternativas e recursos para um fundo internacional. Marina, pelo seu prestígio internacional, seria a pessoa ideal para capitalizar esse fundo de créditos.”

RIGOR

“Quando é não, é não. Teve uma grande usina elétrica que quis se instalar em Itaguaí. Disse: ‘Infelizmente, governador, nessa área não pode ser, vai se transformar numa nova Cubatão’. A regra vai ser dura, mas vamos chamar para discutir.”

FRASES

Carlos Minc
Ministro indicado para o Meio Ambiente

“É um replique do que fizemos com os bombeiros nas unidades de conservação do Rio”

“Vou propor isso ao Exército, que se criem destacamentos, que se aloquem alguns regimentos das Forças Armadas para funcionar dentro dos parques nacionais, cuidando também do entorno deles e das reservas extrativistas”

“Mesmo que eu fique dez anos no governo, não vou conhecer metade da Amazônia como ela (Marina Silva) conhece”

“Se eu fosse elogiado pelos ruralistas ficaria um pouco preocupado”

Crédito da imagem: Marcos D'Paula/AE

domingo, 18 de maio de 2008

OESP - Jirau reforça geração na Amazônia

Renée Pereira

Leilão da segunda hidrelétrica no Rio Madeira, amanhã, abre definitivamente a região para grandes empreendimentos

O leilão da Hidrelétrica de Jirau (3.300 MW), previsto para amanhã, abre definitivamente a fronteira amazônica para a construção de grandes empreendimentos energéticos na região. Com a conclusão da licitação das duas usinas do Complexo do Rio Madeira (Santo Antônio e Jirau), que somam 6.450 MW de potência instalada, em Rondônia, o governo parte agora para uma série de projetos nas bacias do Amazonas, Tocantins, Araguaia e Teles Pires .

Até 2011, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) planeja leiloar sete grandes hidrelétricas (Belo Monte, Teles Pires, Sinop, Marabá, São Manoel, Serra Quebrada e São Luiz) com capacidade instalada de quase 27 mil MW. Esses projetos, avaliam especialistas, exigirão uma elevada dose de bom senso por parte do novo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, que substituirá Marina Silva na pasta.

Mas o trabalho de Minc não deve parar por aí. Cerca de 70% do potencial hidrelétrico a ser explorado no País está localizado na Região Norte, área de elevada complexidade ambiental . Na Bacia do Amazonas, por exemplo, apenas 38% da capacidade não tem algum tipo de restrição ambiental. Em Tocantins/Araguaia, só 8%, destaca o Plano Nacional de Energia 2030, elaborado pela EPE.

Apesar da dificuldade, o governo federal já demonstrou que vai comprar a briga pela retomada das grandes hidrelétricas no País. Alguns especialistas acreditam que Minc será um aliado na liberação das licenças ambientais dos megaempreendimentos, mas com responsabilidade. O primeiro grande desafio do ministro será destravar o licenciamento da hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, cuja capacidade instalada é de 11.182 MW.

Os estudos para a construção da usina foram iniciados há 28 anos pela estatal Eletronorte, subsidiária da Eletrobrás. Durante todo esse tempo, muita coisa mudou, inclusive o nome da unidade. O projeto, que previa um complexo hidrelétrico de duas usinas (Kararaô e Babaquara), acabou sendo revisado e dando origem a Belo Monte, com a capacidade atual.

Hoje, os Estudos de Impacto Ambiental (Eia-Rima) da hidrelétrica estão suspensos por um pedido do Ministério Público Federal do Pará. Desta vez, os procuradores reivindicam a anulação do acordo de cooperação feito pela Eletrobrás e Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e Norberto Odebrecht para realização dos estudos.

O ex-secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo José Goldemberg destaca que é possível licenciar projetos como o de Belo Monte, desde que se tenha muito cuidado. 'Dano ambiental sempre terá. A alternativa é aumentar as compensações ambientais', receita.

Goldemberg acredita que a concessão das hidrelétricas do Madeira (Santo Antônio e Jirau) cria um precedente importante para explorar a Região Amazônica.

EXPERIÊNCIA

O argumento é que o processo de licenciamento e as alternativas encontradas para diminuir o impacto ambiental representam experiência a ser incorporada nas demais usinas. Além disso, cria um padrão de investimento para essas megahidrelétricas, avalia o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Nivalde Castro. 'Ficou claro que a parceria público-privada nesse tipo de projeto, sempre com a presença de uma construtora, deu certo e será usada em outros empreendimentos', diz ele.

Para o presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, Jirau e Santo Antônio representam a viabilidade dos projetos na nova fronteira energética. Ele destaca que a maior crítica em relação aos projetos na região sempre era o preço da energia por causa da distância das usinas em relação aos centros de consumo. Mas o leilão de Santo Antônio, ocorrido no ano passado, mostrou o contrário, diz ele. A energia, incluindo a transmissão, saiu por R$ 78,87 o MW hora. Jirau deve repetir a disputa, já que o preço-teto é de R$ 91, avalia o executivo.

Tolmasquim afirma que, além de Belo Monte, outra usina que poderá ser leiloada no ano que vem é Teles Pires, de 1.820 MW, na divisa entre Mato Grosso e Pará. Em 2010, estão previstas Marabá, São Manuel e Sinop e, em 2011, São Luiz e Serra Quebrada (ver quadro). O maior empreendimento é São Luiz, cuja capacidade será de 9.080 MW, no Rio Tapajós.

'Não podemos deixar de aproveitar o diferencial competitivo que a energia hidrelétrica nos dá. Abrir mão dessa eletricidade seria perder para a concorrência', afirma o diretor-presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace), Paulo Mayon, referindo-se ao preço da energia hídrica comparado ao da energia térmica.

Os anos de experiência na construção de grandes hidrelétricas no Brasil conseguiram reduzir o volume de investimento por quilowatt/hora (kW). De acordo com dados do Plano Nacional de Energia 2030 , há alguns anos, calculava-se que, dos 126 mil MW a explorar no País, até 82 mil MW poderiam ser construídos com custo de investimento em torno de US$ 1.800.

Os números foram revisados com base n orçamento de investimento de 36 projetos hidrelétricos de porte variado, todos produzidos após o ano 2000. O resultado mostrou que os custos diminuíram de forma significativa. Segundo o documento, hoje, o País poderia explorar até 90 mil MW com custo de investimento inferior a US$ 1.200 o kW. Isso sem considerar os custos ambientais.


Usina sem reservatório alivia impacto ambiental


Em compensação, para enfrentar queda da produção na seca, País precisará de mais térmicas

O avanço das hidrelétricas na Região Norte vai exigir a expansão da energia térmica no sistema elétrico brasileiro nos próximos anos. Para reduzir os impactos ambientais e tornar os projetos viáveis, a maioria das usinas está sendo construída sem reservatórios para armazenar água. Essa é uma estratégia para reduzir o tamanho da área alagada. São as chamadas hidrelétricas a fio d'água, que geram a capacidade máxima no período de cheia e reduzem até pela metade no período de seca.

O professor da Universidade de São Paulo (USP), José Goldemberg, destaca que o Brasil não eleva sua capacidade de armazenamento desde meados da década de 80. Isso tudo para conseguir a liberação das licenças ambientais. Ele, que já foi secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, diz que algum reservatório teria de ser feito para dar mais tranqüilidade ao setor, já que o investimento é alto.

Segundo dados do setor, a Hidrelétrica de Belo Monte, por exemplo, geraria 50% menos de energia no período seco. Isso representa um risco muito grande para o setor elétrico, que já viveu um racionamento em 2001 por causa da falta de água nos reservatórios. 'Para resolver esse problema, vamos apostar em todas as fontes de energia térmica, como biomassa, carvão, gás e nuclear', garante o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim. 'Isso é inevitável, pois precisamos das hídricas.'

Nesse contexto, a usina nuclear de Angra 3 passa a ter grande relevância nos planos de geração do País. O projeto, autorizado pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), no ano passado, deverá ter a licença prévia entre esta e a próxima semana. Segundo o assessor da presidência da Eletronuclear, Leonam dos Santos Guimarães, o cronograma prevê ainda a licença de instalação dentro de dois meses.

Com isso, as obras de Angra 3 já começariam no segundo semestre deste ano. A entrada em operação, no entanto, só deverá ocorrer por volta de 2014, se não houver nenhum imprevisto. A previsão é que, no pico da construção, a usina empregará cerca de 9 mil pessoas. Para operar a unidade, será necessário 400 pessoas fixas, diz Guimarães. Segundo ele, além de Angra 3, o Plano Nacional de Energia 2030 prevê a incorporação de 4 mil MW de energia nuclear, sendo 2 mil MW no Nordeste e 2 mil MW, no Sudeste.

BIOMASSA

Outra fonte de energia que não pode ser desprezada no País é a biomassa. Calcula-se que apenas o setor sucroalcooleiro poderia gerar o equivalente a um Complexo do Rio Madeira de energia nos próximos ano. Por isso, o governo já preparou o chamado leilão da energia de reserva, marcado para 30 de julho. O objetivo é usar a energia produzida pelas usinas de açúcar e álcool durante o período de seca. Elas serão complementares, diz Tolmasquim.

Um dos principais problemas para aproveitar esse potencial energético é a conexão das usinas do setor com a rede básica. O plano do governo é que os usineiros arquem com o custo da transmissão, que será construída por empresas especializadas. Haverá um leilão apenas de linhas de transmissão para fazer a conexão entre as usinas a rede.

O professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Nivalde Castro, acha um erro impor aos usineiros o custo pela transmissão da energia. Para ele, esse fator pode ser um inibidor para os empresários entrarem no leilão. Na avaliação de Castro, o Brasil tem de aproveitar o bom momento econômico, com a obtenção do grau de investimento, para atrair novos empreendedores para o setor elétrico.